Arquivo para outubro \17\-03:00 2016

um amor sempre partindo

Uma segunda-feira fria e garoenta em São Paulo. Aniversário do meu amigo mais antigo que, após uma temporada de férias na cidade, está voltando para Chicago. A festa é a três quarteirões de casa e eu saio duas horas atrasada porque fiquei trabalhando até tarde. Nem deu tempo de lavar o cabelo ou colocar as lentes de contato; vesti qualquer coisa e saí apressada de óculos, só queria estar lá para um abraço. Mas aí… você apareceu. Você, com seu sorriso acolhedor, me cedendo seu lugar ao lado do aniversariante. Você, o único outro avulso daquela festa. Você, que mora na Europa há cinco anos e também está só de passagem. Que acha São Paulo muito feia, mas sente falta dos amigos e da família. Você, que compartilha das minhas visões políticas e também se sente velho aos 31. Você, que teve banda de rock que tocava na mtv. Que coloca as mãos na frente do rosto quando fica com vergonha. Que tem muitas opiniões ranzinzas, mas o jeito mais doce de ser rabugento. Você, que apareceu quando eu estava indo viajar, e ia partir quando eu voltasse. Que chega em Lisboa bem no dia em que eu vou embora da cidade. Que foi um encontro feito para desencontrar.

Você, que acha que os romances estão muito líquidos e está difícil achar alguém que merece la pena – eu concordo. Que foi o não-beijo que mais mexeu comigo nos últimos tempos. E que, com sua delicadeza e olhos com qualquer coisa de triste, fez com que essa história se tornasse apenas uma lembrança carinhosa e não mais um coração partido. Porque eu sempre me apaixono por quem está de partida.

Se Vinícius já falou certa vez que a vida é feita dessa tal arte do encontro, embora haja tanto desencontro; eu aceito resignada que um só existe porque o outro aconteceu. E enquanto houver tanta gente se desencontrando em romances rápidos e rasteiros, é esse tipo de (des)encontro inesperado que mantém meu brilho no olho – alguma vez, quem sabe, alguém terá vindo para ficar. E será quando a gente menos esperar – talvez numa segunda fria e com garoa, desleixada e desprovida de expectativas, numa esquina a três quarteirões de casa. 

esperando o melhor, mas sempre preparada para o pior

Assando uma torta de limão quase de madrugada, e o cheiro de manteiga da massa tomando conta da casa. No quinto dia de outubro em que há três anos eu realizava o sonho de me mudar para este apartamento, este ano foi o dia em que eu tive que pedir dinheiro emprestado, após ter uma crise de choro porque me dei conta de que a empresa pra qual eu presto serviço freelancer não tem previsão de me pagar os dois meses que estão atrasados e o que eu tinha disponível não seria mais suficiente para pagar o aluguel e a fatura do cartão de crédito. Em que eu fico questionando se devo mesmo viajar para reencontrar um amor antigo porque a recepção dele não foi tão calorosa quanto eu esperava; após ter tirado o tarô em que saíram as cartas mais auspiciosas possíveis me dizendo que sim, esse era o caminho, “união bem-sucedida” e “recuperando a fé no amor”.

Eu acreditei em tudo. Eu sempre acredito em tudo. Eu sempre serei a pessoa que vai pegar o avião, tomar o ônibus, entrar no trem, para reencontrar alguém. Talvez eu tenha crescido assistindo comédias românticas além da conta e acredite nesse tipo de gesto apaixonado na vida real; portanto eu sempre vou dar essa chance ao amor, porque jamais quero ser uma Nathalia mais velha amargurada e arrependida por ‘não ter tentado’. Mas é essa mesma crença otimista que vezenquando me desestrutura por reconhecer que doo muito e muitas vezes recebo apenas migalhas. E o que retumba na minha cabeça em looping é uma frase que vi num seriado, sobre como a gente tem que “esperar o melhor, mas se preparar para o pior“. Então eu estou sim esperando que as previsões do tarô se confirmem e o melhor aconteça e esse romance interrompido tenha sua merecida segunda chance; mas, ao mesmo tempo, cá estou eu, pensando onde ficarei e o que farei com três dias numa cidade que nunca tive vontade de conhecer, que fala uma língua sobre a qual não tenho domínio algum e ainda num frio paralisante, no início do inverno alemão. Ser sonhadora às vezes é tão cansativo.


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